Manaus – “A cunhã hipnotiza os olhos do luar. A beleza e a forma bela de dançar. Sua pureza, é essência de um vermelho êxtase”. Assim é descrita a item de número 9 do boi da baixa do São José, o Garantido. Veja relatos das cunhãs-porangas que deixaram história com todo seu gingado e beleza no Festival Folclórico de Parintins.
Na língua Tupi, “Cunhã-poranga” significa “mulher bonita da aldeia”. Sua presença na arena do boi é a mistura de história com misticismo. A lenda indígena acredita que esta mulher de beleza exuberante possua poderes míticos que a aproximam dos deuses.
Deusas da Arena
Alessandra Brasileiro defendeu o item por quatro anos consecutivos, de 1998 a 2001. Ela conta que relembra com carinho a fase de muita representatividade. “Disputei com três contrárias diferentes e sempre obtive a vitória. Foi um grande prazer defender as cores do meu boi Garantido, defendi com muita garra e orgulho”, disse Alessandra.
A eterna cunhã-poranga relata que algumas apresentações foram marcantes, mas em especial, a estreia como item na arena do boi em Parintins.
“Todas foram singulares, mas tem algumas que despertam outros sentimentos com euforia. A primeira vez que entrei na arena como item, em 28 de junho de 1998, tinha o nervoso e o peso incrível da responsabilidade. Umas das apresentações mais tensas foi contracenar com o Pajé, que na época era o André Nascimento, no Ritual Fera das Águas, em 1999. A alegoria era grande, estava dividindo o momento com outro item e nada podia dar errado na encenação”, conta.
“Outro momento muito impactante foi em 29 de junho de 2001. Eu usei uma fantasia que representava a metamorfose de uma índia em gavião. Foi inovação no festival e foi um momento muito bonito para minha história como item”, relembrou emocionada
Garantido anos 2000
Depois de Alessandra, quem assumiu o posto foi Lilian Linhares, de 2001 a 2004. A nova cunhã tinha o desafio de ser uma das mais jovens a estrear no Festival e encarar uma grande responsabilidade em defesa do item.
“Eu era muito jovem na época, tinha 15 anos quando comecei e foi um momento mágico. Foi indescritível. Eu lembro que entrei na arena sem nunca ter assistido o Festival de forma presencial, só assistia pela televisão. Tudo foi único e novo. Fui tetracampeã. O Garantido me trouxe muita experiência para a vida, me ajudou na comunicação e relacionamento com as pessoas. Eu era muito tímida e acabei perdendo isso também. Fui melhorando e me lapidando”, disse
Ela contou também que por trás dos bastidores há muita preparação e treino. “A preparação é muito rígida, porque não tem só uma coisa para cuidar. Tem a dança, a parte cênica e física. São muitos ensaios técnicos, treinos e musculação para aguentar aquela fantasia de 20kg por mais de 3 horas. Você tem uma preparação psicológica também com essa disputa acirradíssima e com outras concorrentes, que também estão muito preparadas”, relatou.
“Antigamente não tinha redes sociais, então tudo era muito divulgado na televisão e aumentava ainda mais nossa responsabilidade. Foi meu maior legado, quatro vitórias em quatro anos de participação, já são quase 20 anos que saí do item. Sou feliz e grata por ter feito história”, acrescentou.
Tatiane Barros
Tatiane Barros foi cunhã-poranga durante 10 anos, de 2004 a 2014. O momento mais marcante para a artista foi num momento de superação de todas as barreiras em defesa do item do boi Garantido.
“A apresentação que mais marcou foi do ano do centenário do boi Garantido, em 2013. Foi um ano de verdadeira superação. Torci o tornozelo um dia antes do festival, na passagem de som. Foi uma loucura tudo isso”, relembrou Tatiane.
Parintinense, Tatiana conta orgulhosa dos anos que defendeu as cores vermelha e branca. “Representa a minha origem, pois em Parintins, que é a terra do Boi Bumbá, eu nasci, cresci e atualmente é onde exerço a minha profissão. Por meio do item que exerci pude defender as cores do meu boi, como também levar a nossa cultura para o Brasil e o mundo”, finalizou Barros.
Rayssa Bandeira
Rayssa Bandeira permaneceu no item em 2017, mas assumiu o cargo em dezembro de 2016. Com a preparação do coreógrafo Saullo Assayag, a artista conta como foi a experiência.
“Durante todo tempo estive muito feliz em defender o item, sempre fui acima de tudo torcedora apaixonada do boi garantido, e quis honrar ao máximo o item que já tinha passado por tantas mulheres incríveis”, afirmou com emoção.
Ela relembra como foi a estreia e a grande responsabilidade diante de tantos torcedores e jurados.
“A noite da minha estreia foi indescritível, tudo que eu havia ensaiado e me preparado estava prestes a ser mostrado, fiquei super nervosa, mas acho que é comum. Quando apareci na Arena fiquei apaixonada, a energia da torcida, a grandiosidade do festival me contagiou e eu fui muito feliz, foi uma noite incrível”
Rayssa Bandeira
Como a defesa de um item tão importante já é um desafio, Rayssa conta que um dos maiores que já enfrentou foi entrar na arena em um guindaste de mais de 10 metros de altura. “Foi com certeza o dia mais marcante. Quis realmente ousar e marcar a noite, ousei na fantasia e na forma de entrar na Arena, ainda hoje, quando lembro, me emociono”, acrescentou.
Rayssa permaneceu apenas um ano no item, mas conta que segue apaixonada pelo boi, acreditando e incentivando o festival. “Torço muito por todas que passam pelo item e com certeza nunca esquecerei de toda emoção que foi representar meu boi do coração da Arena”, finalizou.
Atual cunhã-poranga
Quem representa a mulher mais bonita da aldeia atualmente é Isabelle Nogueira, que entrou no ano de 2015 como Rainha do Folclore e, em 2018, assumiu o posto de cunhã-poranga. Ela conta com muito entusiasmo o que significa realizar um sonho de infância.
“Ser a cunhã poranga do meu boi é um mix de sentimentos: realização, emoção, gratidão e felicidade. Falo isso toda vez que perguntam sobre o assunto. Antes eu fui Rainha do Folclore e muito antes, mesmo quando criança, já era louca para ser item. Eu era dançarina de palco e me sentia distante do meu sonho. Eu me sinto muito realizada, estava diante de mulheres gigantes. A maior realização é conhecer de perto o carinho dos torcedores”, declarou.
Este é um momento de indecisão, pois ainda não há data sobre a realização do Festival Folclórico de Parintins em 2020, por conta da pandemia do novo Coronavírus. Isabelle conta estar otimista e espera por dias melhores.
“Esse festival ia ser incrível, mas Deus sabe o que faz. Eu espero que tudo isso passe e a gente possa ter grandes festas e ventos. Como também matar a saudades que temos do nosso povo, da nossa nação vermelha” finalizou.
Fonte: Em tempo
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